Os bancos e o Código de Defesa Consumidor

A comunidade jurídica nacional está perplexa: a Confederação Nacional do Sistema Financeiro ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra o art. 3º, § 2º, do CDC, que inclui os serviços bancários, financeiros, de crédito e securitários entre as relações de consumo.

Argumenta a CONSIF que essas matérias devem ser tratadas em lei complementar, hierarquicamente superior ao CDC, conforme dispõe o art. 192 da Constituição Federal.

A perplexidade vem do fato de que o fundamento apresentado beira a má-fé, pois a regulamentação a que se refere a norma constitucional diz respeito ao sistema financeiro enquanto instrumento da política monetária. O CDC, por conseguinte, não padece de qualquer inconstitucionalidade. E não poderia ser diferente: a exigência de regulação por lei complementar é absurda, pois se atendida em relação às matérias contidas no CDC – proteção e interpretação contratual, por exemplo -, não poderia deixar de se estender a todas as normas de direito civil e comercial que tenham aplicação nas relações entre os bancos e seus clientes.

Mas pelo menos a CONSIF não pretende que o Banco Central do Brasil julgue causas em que estejam envolvidas as instituições financeiras, como chegou a defender, mais realista do que o rei,  Sérgio Darcy, diretor de Normas desse órgão…

Outros argumentos utilizados pelos advogados da CONSIF, Arnold Wald e Ives Gandra Martins, em artigo publicado na Folha de São Paulo (edição de 25.01.2002), dispensariam maiores considerações, por não relacionados com o exame da constitucionalidade. Mas me parece oportuno examinar o de que é conveniente que o sistema financeiro seja regulamentado em separado, porque assim é na maioria dos outros países.

Essa afirmação é totalmente inverídica, ao menos no que diz respeito aos países civilizados. Para chegar a esta conclusão é suficiente que se leia a Diretiva nº93/CEE, editada com a finalidade de harmonizar as legislações dos países integrantes da Comunidade Européia no tocante às cláusulas abusivas nos contratos de consumo: nela, os fornecedores de serviços financeiros são claramente colocados como destinatários dos novos regramentos legais.

Considerados, portanto, unicamente os aspectos jurídicos da questão, não haveria o que temer. Mas um retrocesso sempre é possível: este é um país em que a cobrança de juros extorsivos, em especial dos consumidores de baixa renda, tornou-se uma instituição, acobertada pelo chavão de que, digam o que disserem, os contratos devem ser cumpridos.

Porto Alegre, 11.02.2002

Carlos Alberto Etcheverry

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